País perde 37% da água que trata,
segundo SNIS.
Quando o assunto é perda de água
tratada, o Brasil ocupa a 20ª posição em um ranking com 43 países. O
levantamento foi feito pelo IBNET (International Benchmarking Network for Water
and Sanitation Utilities), com dados de 2011. De acordo com o estudo, o Brasil
perde 39% de sua água tratada. As perdas antes que a água chegue ao consumidor
final incluem casos como vazamentos e ligações clandestinas.
Perda de água por país (Foto:
Editoria de Arte/G1)
Na lista, o Brasil fica atrás de
países como Vietnã (que perde 31%), México (24%), Rússia (23%) e China (22%). O
que mais perde água tratada na lista é Fiji, um país insular da Oceania que
desperdiça 83% da água que trata. Já entre os com menor índice de perda estão
Estados Unidos (13%) e Austrália (7%).
O dado do IBNET em relação ao
Brasil em 2011 é semelhante ao verificado no mesmo ano pelo Sistema Nacional de
Informações sobre Saneamento (SNIS), ligado ao Ministério das Cidades. Segundo
o órgão, o índice de perda em 2011 era de 38,8%.
O dado mais atualizado do SNIS
sobre as perdas de água tratada no Brasil é de 2013. Naquele ano, 37% da água
tratada no país foi perdida.
O número representa 5,8 trilhões
de litros de água. Isso seria suficiente para abastecer a cidade de São Paulo
por sete anos e meio. O cálculo foi feito pelo G1 levando em conta apenas a
água utilizada para consumo humando, considerando que, em 2013, a média de
consumo no estado era de 188 litros diários por habitante, segundo o SNIS. Já o
Instituto Trata Brasil estima em 39,1% do total produzido a perda de água
tratada.
A quantidade de água desperdiçada
inclui perdas com vazamentos em adutoras, redes, ramais, conexões,
reservatórios e outras unidades operacionais do sistema. Esses vazamentos são
verificados principalmente em tubulações da rede de distribuição, provocados
especialmente pelo excesso de pressão em regiões com grande variação de relevo.
Também estão inclusas nos 37% as
perdas chamadas pelo SNIS de “não físicas”, que é a água que foi efetivamente
utilizada porém não foi medida e deixou de gerar faturamento às empresas
prestadoras do serviço. Isso compreende situações como erros de medição
(hidrômetros inoperantes, com submedição, erros de leitura, fraudes), ligações
clandestinas, “gatos” e falhas no cadastro comercial.
Os estados do Sudeste e do
Centro-Oeste estão abaixo da média nacional de perda de água tratada, com
índice de 33,4%. A região que tem esse tipo de desperdício mais acentuado é a
Norte (50,8%), seguida por Nordeste (45%) e Sul (35,1%). Entre as capitais, a
variação no índice de perdas é ampla, com a menor em Goiânia, com 21,3%, e a
maior em Macapá, 73,6%.
Segundo Rogério Aparecido Machado,
professor de Química e Gestão Ambiental da Universidade Presbiteriana
Mackenzie, os vazamentos e as ligações clandestinas de água realmente são
responsáveis por uma grande parte da perda de água tratada. Porém o
especialista também atenta para a água tratada que é lançada em rios poluídos.
A gente perde muita água não só
por vazamento, como também nessas ligações clandestinas as quais não têm
controle algum. Mas há outra coisa: nós perdemos muita água porque tratamos nas
estações de tratamento de esgoto e a maioria delas não retornam a água para os
mananciais”, aponta Machado.
“A água vai acabar parando em rios poluídos.
Se desperdiça esse tratamento pois se devolve para o rio sujo na maioria das
vezes.” Em São Paulo, o professor cita como exemplo a água tratada que é
lançada no Ribeirão dos Meninos, em São Caetano do Sul. “Vai para o Tamanduateí
e Tietê”, descreve.
Machado reconhece que lançar água
tratada em locais poluídos como o Tietê e o Pinheiros, em São Paulo, ajudam a
não agravar a situação desses rios. Porém, ele afirma que a ação, além de
desperdiçar a água tratada, não é suficiente para a limpeza dessas águas
contaminadas. “Você diminui a quantidade de poluição desses rios, não tenha
dúvida. Só que seria muito mais inteligente retornar essa água a um rio que vá
cair para uma represa.”
Para Malu Ribeiro, coordenadora da
Rede das Águas da Fundação SOS Mata Atlântica, lançar esgoto em áreas de
mananciais é uma medida “perversa”. “É o caso da Billings, em São Paulo, por
exemplo. Isso é um desperdício muito maior do que o que se perde nos canos, ou
o que a gente perde em casa lavando chão. Lançar esgoto sem tratamento em
qualquer corpo d’água é crime. Mas, no Brasil, tem lei que pega e lei que não
pega”, afirma ela.
Malu também atenta para casos de
ocupações habitacionais irregulares próximas a áreas de represa, que acabam
poluindo a água que poderia ser utilizada para consumo humano. “Estima-se que a
gente tenha 2,5 milhões de pessoas morando nessas situações em áreas de
manancial na região metropolitana [de São Paulo]. Essas pessoas estão expostas
a risco de saúde pública, desprovidas do acesso a água tratada, alguns têm
‘gato’ de água”, aponta. “Esse perfil de ocupação do solo sem planejamento
dificulta a questão do saneamento.”
“A gente tem que fazer moradia
popular, mas em local adequado”, defende Malu. “Colocar essas pessoas em área
de manancial é fazer o que foi feito de 1960 até o final dos anos 80. É um
crime.”
“A gente perde muita água por
vazamento e ligações clandestinas. Mas
há estações de tratamento de esgoto que não retornam a água para mananciais, e
a água acaba em rios poluídos."
Rogério Machado, professor de
Química e Gestão Ambiental
Malu afirma que redes de
saneamento muito antigas em capitais como Rio de Janeiro e São Paulo também
contribuem para a manutenção de um alto índice de perda de água tratada. “Essas
capitais têm redes muito velhas”, diz.
Água não aproveitada
Machado e Malu atentam para o mau
aproveitamento da água da chuva no Brasil. “Tem tudo feito, mas na hora de
aproveitar a água, não consegue. Existe tubulação na rua que é só para pegar
água da chuva. Essa água deveria estar pensada para não se sujar, para que no
final da tubulação não estivesse misturada com esgoto e fosse para mananciais.
Mas o problema é que na tubulação por onde passa a água de chuva tem um monte
de ligação de esgoto clandestino”, diz Machado.
Malu ressalta que a água da chuva
em grandes centros urbanos já chega poluída por causa da própria sujeira nas
cidades. No entanto, ela não descarta o reuso dessa água.
“Água de chuvas pode ser
aproveitada mediante tratamentos, porque ela é muito poluída. No Piscinão do
Pacaembu, em que a SOS Mata Atlântica faz análise de agua, ela é muito poluída.
Vem como todo tipo de contaminante. Mas pode ser essa ‘água cinza’ para lavar
rua depois de feira livre, irrigar jardins, enfim, para usos menos nobres. Só
que não existe norma hoje. Nós precisamos criar uma orientação técnica.”
Para Malu, o mau uso da água no
Brasil reflete um fator cultural. “A gente vive no Brasil com uma falsa ideia
de abundância de água”, opina.
O que dizem as empresas
Em São Paulo, a Sabesp diz que em
2014 aumentou em 31% das vistorias de perdas de água com fraudes. No ano, o
volume desviado por fraudes foi de 2,6 bilhões de litros de água potável,
suficientes para abastecer 260 mil pessoas por um mês inteiro. O aumento no
número de fraudes detectadas foi de 13% em relação a 2013, e o valor cobrado
dos fraudadores foi de R$ 17,4 milhões. “O volume recuperado foi de 2,6 bilhões
de litros, o que corresponde a dois dias de produção do Sistema Cantareira
atualmente”, diz a Sabesp.
No Rio de Janeiro, a Cedae
informou que o índice de perdas com vazamentos e ligações clandestinas é de 30%
de toda a água tratada. A empresa afirma que esse número vem reduzindo ano a
ano, porém não possui dados fechados dos últimos meses.
Em Minas, a Copasa divulgou em seu
site que adotou um programa para reduzir o índice de perdas na Região
Metropolitana de Belo Horizonte, que atualmente chega a 40%. “Uma das
principais ações foi o lançamento do programa CaçaGotas, que conta com 40
equipes de campo, cada uma com dois integrantes, especializadas no combate ao
vazamento”, diz a empresa. “As principais causas das perdas são os vazamentos
no percurso entre a distribuição e o consumidor e as ligações clandestinas,
conhecidas como ‘gatos’. A meta da Copasa é reduzir o tempo de chegada das
equipes aos locais de nove para quatro horas e, dessa forma, minimizar a
gravidade das ocorrências.”
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